Gestão de Pequenas Empresas

 

 

 

 

Uma rainha à porta

Francisca Vega

Corriam os primeiros meses de 1997 e a vida da brasileira MárciaCarvalheiras era um desastre. Em meio a uma das piores crises econômicas que golpearam o Brasil, a empresa em que trabalhava fechou e seu marido também ficou desempregado. No mesmo ritmo em que os jornais enchiam suas páginas com notícias sobre a desvalorização do real, a família Carvalheiras viu sua condição de classe média lhe escapar num pavoroso transe. “Sentia que não havia saída de emergência”, diz Márcia. “Nem sequer podia pagar a faxineira ou saldar minhas contas à vista.” Ser formada em contabilidade de nada lhe servia; agora Márcia pagava tudo àprestação.

Mas uma carta que chegou em sua caixa de correios transformou sua vida e deu um ponto final aos bicos que lhe garantiam alguns reais. Era um catálogo da empresa de roupas Quatro Estações, que vendia produtos porta-a-porta. A mensagem do folheto era clara: convidava Márcia a somar-se às revendedoras da companhia, recrutar mulheres para a sua força de vendas e, claro, a comprar. Entre amigos e parentes, os Carvalheiras reuniram 19 revendedoras no final de 1997 e, com os porcentuais pelas vendas, faturaram US$ 158 mil, uma receita mensal de US$ 11,2 mil. Sem mais o que fazer com o dinheiro no bolso, Márcia prognosticou que a venda porta-a-porta poderia ser um bom negócio e pôs mãos à obra: alugou um escritório e utilizou toda sua imaginação para chamar mais mulheres.

Pelo alto-falante instalado em cima de seu Fiat, se escutava: “Atenção jovens e senhoras, querem ganhar dinheiro extra?” Pagou apenas US$ 4 pela gravação e assim passeou pelos bairros de baixa renda de São Paulo. Se não estava de carro, entregava panfletos em feiras livres, escolas infantis e estações de trens. “Tinha vergonha, mas precisava ir onde as mulheres estavam”, diz Márcia. De tanto transitar, um dia recebeu um telefonema de uma tia que afirmava tê-la visto distribuir papéis na rua e não imaginava que sua situação estava tão mal. Márcia a consolou: “Não entrego panfletos, estou formando a minha empresa.” E, nesse dia, disse adeus à vergonha.

Hoje Márcia Carvalheiras é uma das principais representantes da Avon no Brasil, através de sua empresa O Rei dos Catálogos. Dá trabalho a mais de 10 mil revendedoras, tem 15 franquias em São Paulo e vende 350 mil produtos por ano, dos quais, no ano passado, 195 mil eram da Avon. Com um crescimento explosivo desde 2000, O Rei dos Catálogos faturou US$ 1,2 milhão em 2005, cifra que deverá crescer 15% este ano. Os dois dígitos de crescimento a acompanham desde que formou sua empresa. E seus planos não têm limites: estuda exportar seu modelo para o México ou Portugal. Márcia já não é de classe média. Já se pode dar alguns gostos de rica.

Sem sequer imaginá-lo, os Carvalheiras entraram na roda de um negócio milionário. A venda direta movimentou no Brasil US$ 5,53 bilhões em 2005, 20,4% mais que em 2004. Cerca de 1,5 milhão de revendedoras trabalham no porta-a-porta e venderam 1,1 bilhão de itens no ano passado: ou seja, 11,5% a mais que em 2004. Segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Vendas Diretas (ABEVD), essas cifras vêm crescendo a dois dígitos nos últimos sete anos. E o sucesso é tanto que o Brasil é o quarto mercado de vendas porta-a-porta do mundo, depois de Estados Unidos, Japão e Coréia. Um sucesso destacado pela World Federation of Direct of Selling Associations (WFDSA), organização de agrupa esse setor.

Negócio da crise. A chave está em saber aproveitar as oportunidades. “A venda porta-a-porta é um fenômeno naqueles países com alta taxa de desemprego”, diz o argentino Jorge Méndez, representante na Argentina do World Federation of Direct of Selling Associations, com base em Buenos Aires, que revela que esse negócio movimentou US$ 96 bilhões e garantiu atividade a 54,4 milhões de pessoas no mundo em 2004. “Promete seguir crescendo nos próximos anos na América Latina, já que é uma alternativa para milhões de mulheres e jovens que não têm um emprego estável.”

Que o diga a Avon. Entre crise e recuperação econômicas, o Brasil é o segundo mercado da Avondepois dos EUA, somando US$ 1,8 bilhão em 2005. Melhor ainda, a filial brasileira conta com 1 milhão de revendedoras, o maior número da multinacional no mundo. “O porta-a-porta é uma possibilidade garantida de emprego”, diz Luis Antonio Fernández, diretor executivo de vendas da Avon no Brasil. “Despachamos 704 milhões de itens e 60% de nossas empregadas são mulheres.” É aqui onde entra O Rei dos Catálogos, que recebeu por seis vezes o prêmio de melhor vendedor da empresa. “Ainda que existam muitas como ela, Márcia tem uma política comercial agressiva e seu empreendimento é notável”, diz Fernándes. Por isso, faz parte do chamado Clube de Empreendedoras da Avon, onde recebe treinamento constante e produtos a preços preferenciais.

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